Quem nasceu nos anos 50, 60 e 70 irá lembrar. Somos de uma geração que aproveitou todas as fases da vida. Brincávamos na rua, comíamos doces açucarados e não tínhamos problema, a TV era preto e branco – a em cores chegou em 1972, foi surreal. Aparelho de som era vitrola em móvel ou vitrolinha (portátil). O telefone chegou nas casas em meados dos anos 70, era muito caro e nem todas as famílias podiam ter. Nos comunicávamos com pessoas distantes por carta ou telegrama (esse era mais rápido em caso de urgência). As crianças e adolescentes tinham disciplina e respeitavam, e muito, os mais velhos. Mas éramos felizes, e sabíamos.
Crescemos na época da ditadura militar no Brasil, com censura, regras duras, violência e muita repressão, não havia liberdade, tudo era controlado. Boa parte das músicas, até pouco antes das Diretas Já, em 1984/85, eram de revolta, totalmente politizadas, tanto que muitos artistas da época, como Renato Russo – sobre o qual fiz um artigo recentemente –, que era revolucionário e revoltado com a política no país. Não só ele, mas muitos outros antes dele, como Chico Buarque, Geraldo Vandré, Caetano Veloso e Gilberto Gil. Mas éramos felizes, e sabíamos.
A juventude era reprimida, nas baladas havia juizado de menor, e quem estivesse e fosse menor era retirado mesmo. Mas, mesmo assim, foi uma época cheia de novidades, quando surgiram as discotecas com globo de luzes, gelo seco e muita música boa. E filmes como ‘Os embalos de sábado à noite’ inspirando os concursos de dança da época. Na música se destacavam Rita Lee, Bee Gees, Legião Urbana, Cazuza, Village People, entre tantos outros que ficaram na história. Mas era ditadura, e até hoje lembramos com saudosismo de uma época que, ao mesmo tempo em que tinha muitos problemas, também foi tudo muito mágico. Mas éramos felizes, e sabíamos.
Nos tornamos adultos, mas nossas lembranças estão vivas como nunca. Músicas que encantam até hoje os mais jovens, a moda que vai e volta, mas a vida que tínhamos nunca mais foi a mesma, ficou na lembrança. Mas éramos felizes, e sabíamos.
Nos tornamos adultos e tivemos que encarar um mundo muito pior do que aquele que passamos por situações de medo, mas conseguiram piorar. Hoje o que nos faz fortes e vivos são as nossas lembranças, estas sustentam a tristeza que temos que viver. Muitas vezes me pego refletindo sobre tudo o que estamos vivendo, como as pessoas se tornaram cruéis ao ponto de desmerecer alguém que nem conhece, sendo extremamente agressivos, tocando em feridas que nem sabe se aquilo pode levar aquela pessoa ao caos. Naquela época não tínhamos a internet, a evolução era menor. Mas éramos felizes, e sabíamos.
O Ser humano se transformou num Ser não identificado, porque de humano não tem nada. Assistimos diariamente pessoas agindo como se pudessem fazer o que desejarem sem que isso lhes traga uma consequência futura. O poder tornou-se uma doença mental, não conseguem mais viver sem a soberba; e agora estão tentando mandar no mundo.
Só digo uma coisa: sei que muitos não acreditam, mas não somos desse mundo, um dia voltaremos de onde viemos e lá não tem carteirada, lá não existe poder nem disputa de quem é melhor, e também toda fortuna exagerada que se acumulou aqui sem saber o que fazer também não precisa. Então para quê essa gana por dinheiro, por poder? É triste ver que o homem ficou escravo de tudo isso, ficou escravo da sua aparência, ficou escravo do seu carro, da sua casa, da sua conta bancária, das suas roupas. Nada disso fará diferença, a única coisa que precisará será o bem que fez aqui, e não é feliz quem não fez nada disso. Quem vive por um propósito já entendeu que nada disso é importante, o que nos faz importante é ser feliz, e mesmo sendo tudo diferente, ainda assim nós éramos felizes. E sabíamos.